Há muito tempo, resumi O estrangeiro em uma frase que, reconheço, é bastante paradoxal: em nossa sociedade, todo homem que não chora no enterro de sua mãe corre o risco de ser condenado à morte.
O que eu queria dizer era apenas que o herói do livro é condenado porque não jogou o jogo. Nesse sentido ele é estrangeiro à sociedade onde vive e na qual é um ser errante pelos bairros periféricos da vida privada, solitária, sensual. E foi por isso que alguns leitores foram tentados a considerá-lo um delinquente.
Teremos no entanto uma ideia mais exata do personagem – pelo menos, mais de acordo com as intenções de seu autor – se nos perguntarmos em que sentido Meursault não joga o jogo. A resposta é simples: ele se recusa a mentir. Mentir não é apenas dizer o que não é. É também, e principalmente, dizer mais do que é, no que diz respeito ao coração humano, dizer mais do que se sente. É o que fazemos todos, todos os dias, para simplificar a vida. Meursault, ao contrário do que as aparências indicariam, não quer simplificar a vida. Ele diz o que é, recusa-se a mascarar seus sentimentos e, aí, imediatamente a sociedade se sente ameaçada. Pedem-lhe, por exemplo, que diga que se arrepende de seu crime, segundo a fórmula consagrada. Ele responde que se sente mais aborrecido do que propriamente arrependido em relação a seu crime. E é essa nuança que o condena.
Portanto, Meursault não é, para mim, um delinquente, mas um homem pobre e nu, apaixonado pelo Sol que não deixa sombras. Longe de ser desprovido de sensibilidade, uma paixão profunda, porque tenaz, o anima: a paixão pelo absoluto e pela verdade. Trata-se ainda de uma verdade negativa, a verdade de ser e de sentir. Sem ela, no entanto, nenhuma conquista sobre si mesmo jamais será possível.
Assim, não estaria muito enganado quem lesse em O estrangeiro a história de um homem que, sem nenhuma atitude heroica, aceita morrer pela verdade.