Sempre sonhei* chegar sozinho a uma cidade estrangeira, sozinho e desligado de tudo. Teria vivido humildemente, miseravelmente até. Mas, antes de tudo, teria mantido o segredo. Sempre me pareceu que falar de mim mesmo, mostrar-me tal como sou, agir em meu nome, era justamente trair algo meu, e o mais precioso. O quê? Trata-se provavelmente de um sinal de fraqueza, uma falta daquela força necessária a todo ser para não apenas existir como também afirmar sua existência. Não sou mais ingênuo, já não acredito que essa enfermidade de nascença seja uma superioridade da alma. Mas sobrou o gosto pelo secreto. Escondo ações insignificantes pelo prazer de ter uma vida só para mim.
Uma vida secreta. Não uma vida solitária, mas uma vida secreta. Por muito tempo acreditei que esse era um sonho realizável. Uma vida solitária é uma utopia.
* Resigno-me a dizer “eu”, mas não tenho maior fé na sinceridade do “eu” do que no distanciamento do “ele” dos romancistas.