Tentem reconstruir um diálogo de sua própria vida, o diálogo de uma briga ou um diálogo de amor. As situações mais caras, as mais importantes, ficam perdidas para sempre. O que sobra delas é seu sentido abstrato (eu defendi esse ponto de vista, ele defendeu outro; fui agressivo, ele foi defensivo), eventualmente um ou dois detalhes. Mas o concreto acústico-visual da situção em toda a sua continuidade fica perdido.
E não apenas fica perdido, mas nem ao menos nos surpreendemos com essa perda. Ficamos resignados com a perda do concreto no tempo presente. Transformamos de imediato o momento presente em sua abstração. Basta contar um episódio que vivemos há poucas horas: o diálogo se encolhe num breve resumo, o ambiente, em alguns dados gerais. Isso é válido até mesmo para as lembranças mais fortes que, como um traumatismo, se impõem ao espírito: ficamos de tal modo fascinados por sua força que não nos damos conta de como seu conteúdo é esquemático e pobre.
Se estudamos, discutimos, analisamos uma realidade, a analisamos tal qual ela aparece em nosso espírito, em nossa memória. Só conhecemos a realidade do tempo passado. Não a conhecemos tal qual ela é no momento presente, no momento em que acontece, no momento em que é. Ora, o momento presente não se parece com sua lembrança. A lembrança não é a negação do esquecimento. A lembrança é uma forma de esquecimento.
Podemos manter assiduamente um diário e anotar todos os acontecimentos. Um dia, relendo as notas, compreendemos que elas não são capazes de evocar uma só imagem concreta. E, pior ainda: que a imaginação não é capaz de socorrer nossa memória e de reconstruir o esquecido. Pois o presente, o concreto do presente, como fenômeno a ser examinado, como estrutura, é para nós um planeta desconhecido; não sabemos portanto nem como retê-lo em nossa memória nem como reconstrui-lo pela imaginação.
Morremos sem saber o que vivemos.